Direito real de habitação é a prerrogativa que detém o cônjuge sobrevivente de, após o falecimento de seu consorte, continuar residindo no imóvel que até então era ocupado pelo casal.
De início é de se destacar que, em que pese a lei não garanta tal direito aos conviventes em união estável, a jurisprudência o vem estendendo ao companheiro, em razão da atual equiparação de tal instituto com o matrimônio.
O direito de habitação ora abordado, fruto dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar, possui regramento específico no artigo 1.831 do Código Civil, que dispõe que “ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar”.
Trata-se de um direito sucessório que deve ser requerido e reconhecido pela via judicial e subsiste de forma vitalícia (inclusive nas hipóteses em que o cônjuge sobrevivente – por algum motivo – não seja contemplado na partilha do imóvel residencial destinado à residência da família.
Em decorrência disto, o dito imóvel pode ser partilhado em favor de um único herdeiro, o qual será privado de exercer com plenitude sobre ele as prerrogativas inerentes à propriedade (usar, gozar e dispor da coisa, bem como reavê-la, na forma do artigo 1.228 do Código Civil), pois tal exercício estará sujeito à existência do direito real de habitação em proveito do cônjuge sobrevivente.
Nessa tônica, recentemente foi publicado acórdão (REsp 1582178/RJ) proferido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que definiu que o único requisito imposto por lei para assegurar ao companheiro ou cônjuge sobrevivente o direito real de habitação é que o imóvel destinado à residência do casal fosse o único de natureza residencial a inventariar.
Vale dizer que no entendimento da Corte Superior, o fato daquele que pleiteia o reconhecimento do direito real de habitação eventualmente ser proprietário ou detentor de outro imóvel de natureza residencial não lhe retira o direito de habitar o imóvel que residia ao tempo da abertura da sucessão, porquanto o imóvel particular do sobrevivente não compõe o acervo de bens inventariáveis. Em outras palavras, o imóvel que pertence exclusivamente ao sobrevivente não influirá no seu direito de moradia, justamente por não integrar a herança do de cujus.
O Ministro relator destacou, ainda, que “até mesmo essa exigência legal – inexistência de outros bens imóveis residenciais no acervo hereditário – é amplamente controvertida em sede doutrinária”, citando precedente de caso em que o C. STJ “afastou a literalidade de tal regra”.
Por derradeiro, é de se destacar que o julgamento do caso retratado no acórdão mencionado neste texto não foi unânime: a Ministra Nancy Andrighi, com a sapiência que lhe é peculiar, apresentou voto divergente ao colegiado, onde assentou que “a manutenção do direito real de habitação quando inexistente risco à moradia da recorrida [v.g. quando existentes outros imóveis residenciais no patrimônio particular do sobrevivente] equivaleria a aquiescer com uma conduta que contraria frontalmente a razão de existir do instituto, admitindo que, às expensas exclusivamente dos demais herdeiros que serão privados do uso, fruição e disposição do bem provavelmente por um longo período, coloque-se a companheira sobrevivente em injustificável e desnecessária posição de vantagem em relação aos demais herdeiros”.
Nada obstante, quando do julgamento do REsp 1654060 / RJ, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, em decisão unânime, igualmente definiu que o direito real de habitação não admite o aluguel ou empréstimo do imóvel à terceiros.
As decisões proferidas por ocasião do julgamento do REsp 1582178 / RJ e REsp 1654060 / RJ (aqui abordados) podem ser acessadas através dos links abaixo:
http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?processo=1582178&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true