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05/02/2024

SEPARAÇÃO DE BENS NOS CASAMENTOS E UNIÕES ESTÁVEIS COM PESSOA MAIOR DE SETENTA ANOS NÃO É OBRIGATÓRIA

O Código Civil impunha o regime de separação obrigatória de bens nos casamentos com pessoa maior de 70 (setenta) anos, a teor do seu artigo 1.641, inciso II[1].

Ou seja, bastava que um dos nubentes contasse com idade igual ou superior a 70 (setenta) anos na data da habilitação para o casamento para que referida norma impusesse que o regime de bens do casamento fosse o de separação bens, retirando das partes o direto de escolha do regime a ser adotado.

Tal regime matrimonial determina que todos os bens do casal, sejam eles adquiridos antes ou depois do casamento, permanecerão particulares de cada cônjuge, ou seja, não há formação de patrimônio compartilhado, sendo cada um dos cônjuges responsável pelo gerenciamento do seu próprio patrimônio (dispensando-se a outorga uxória) e pelas dívidas que vier a contrair, sem que isso venha a afetar ou interferir na esfera patrimonial do outro.

Por consequência, tal regramento aplicava-se também nos casos de constituição de união estável com pessoa maior de 70 (setenta) anos, uma vez que, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal), as pessoas que vivem em união estável tem direito à aplicação das mesmas regras para a divisão de herança das pessoas casadas (RE 878.694, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. em 10.05.2017).

Inexistindo patrimônio compartilhado e sobrevindo o divórcio das partes ou a morte de um dos cônjuges, não resta ao outro direito à meação ou herança.

Salienta-se que tal regime de bens não impede a aquisição de bens conjuntamente pelo casal, (hipótese em que há a formação, somente, de um condomínio), tampouco afasta o dever mútuo dos cônjuges na contribuição das despesas do casal na proporção dos seus rendimentos e seus bens, salvo estipulação contrária em pacto antenupcial, tal qual previsto no artigo 1.688 da legislação civil[2].

Em 01.02.2024, o Supremo Tribunal Federal, em importante julgamento de Recurso Extraordinário com Repercussão Geral (Tema 1.236), por unanimidade, entendeu que a regra que impõe ao maior de 70 (setenta) anos o regime de separação de bens desrespeita o direito de escolha das pessoas idosas, discriminando-os em razão da sua idade sem fundamento razoável, violando, por sua vez, o artigo 3°, IV, da Constituição Federal que preconiza que: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (…) IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”.

Sendo assim, com o julgamento plenário da Excelsa Corte, nos casamentos e união estáveis com pessoa maior de 70 (setenta) anos, a separação obrigatória de bens poderá ser afastada, desde que de comum vontade das partes.

Nesta hipótese, para casamentos que serão celebrados a partir do julgamento em questão, basta que o regime de bens de escolha dos nubentes seja estabelecido em escritura pública, ou seja, em um cartório notarial.

Para pessoas já casadas sob tal regime, faz-se necessário apresentar o consentimento dos cônjuges para alteração do regime matrimonial, indicando o novo regime a ser adotado, judicialmente. A alteração, por sua vez, só produzirá efeitos perante à divisão de patrimônio futuro (adquirido após a manifestação de vontade).

No caso de omissão das partes em manifestar vontade diversa, aplicar-se-á ainda o regime de separação bens.

Assim, fixada pelo Plenário do STF a tese de Repercussão Geral Tema 1.236 com o seguinte teor:

“Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no artigo 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes mediante escritura pública”.

O entendimento prestigia a autonomia da vontade da pessoa maior de 70 (setenta) anos juridicamente capaz, concedendo-lhe igualdade de direitos na escolha da disposição do seu patrimônio, estando em plena consonância com os fundamentos constitucionais e, principalmente, com a isonomia lá instituída.


[1] Artigo 1.641. É obrigatório o regime de separação de bens no casamento: (…) II – da .pessoa maior de 70 (setenta) anos.  

[2]  Art. 1.688. Ambos os cônjuges são obrigados a contribuir para as despesas do casal na proporção dos rendimentos de seu trabalho e de seus bens, salvo estipulação em contrário no pacto antenupcial.

Escrito por:

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Marcela Marcondes Rodrigues
Advogada - OAB/PR 72.324 break Departamento - Cível e Comercial break marcela.rodrigues@marangehlen.adv.br break

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