O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 49, prevê a possibilidade do consumido desistir de compras realizadas fora do estabelecimento comercial (isto é, por telefone, internet, aplicativos de delivery, etc). Trata-se do chamado direito de arrependimento, que pode ser exercido em até 7 dias da compra realizada.
Nesta hipótese, o consumidor deve proceder a devolução da mercadoria ou serviço adquirido (desde que não utilizados, obviamente) e ser imediatamente reembolsado dos valores dispendidos em sua aquisição.
Pois bem. Em decorrência das medidas de distanciamento social impostas pelos órgãos públicos e do fechamento dos estabelecimentos comerciais físicos em todo o país por força da pandemia do COVID-19, é fato notório o exponencial aumento do número de compras e contratações realizadas a distância, na modalidade de delivery.
Consequência disto é que fornecedores de produtos e prestadores de serviços que não atendiam a demandas desta natureza estão tendo que adaptar sua forma de atuação no mercado, como maneira de minimizar os impactos negativos ocasionados pela diminuição do movimento físico em seus estabelecimentos comercias.
Feitas estas considerações, é de se ponderar que o direito de arrependimento em comento traz ao fornecedor de produtos ou serviços (que já se encontra fragilizado em razão dos efeitos econômico-financeiros oriundos da pandemia do Coronavírus e do fechamento dos comércios físicos) uma certa álea ou insegurança jurídica transitória, que perdura pelos 7 dias subsequentes à compra ou contratação. Isto porque, como dito, neste período de reflexão, o consumidor pode simplesmente desistir da compra e tem o direito de receber seu dinheiro de volta.
Em face de tudo isto, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei (PL) n° 1179/2020 que, dentre outras medidas que visam diminuir os impactos jurídicos, econômicos e financeiros das relações de direito privado no período da pandemia do Coronavirus (covid-19), promove sensíveis transformações no exercício do direito de arrependimento, assegurado pela legislação consumerista.
O artigo 8º do aludido PL, cuja votação está programada para esta sexta-feira (03/04/2020), suspende temporariamente “a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de produto ou serviço adquirido por entrega domiciliar (delivery)”.
É dizer que, caso aprovado o PL 1179/2020, o consumidor não mais poderá se arrepender das compras realizadas pela internet ou telefone (para entrega domiciliar) e devolver os produtos ou serviços adquiridos em transações comerciais consolidadas até do dia 30/10/2020. Via de consequência, igualmente não terá direito a reembolso na hipótese de arrependimento.
Tal disposição tem o escopo de garantir maior certeza jurídica às relações consumeristas (especialmente do ponto de vista do fornecedor, que vem enfrentado inúmeras dificuldades, inclusive de ordem logística) e não altera as disposições legais acerca do tema, apenas suspende e limita sua aplicação ao caso concreto, para as relações jurídicas entabuladas durante o período de calamidade pública.
Por fim, considerando a regra do art. 8º do PL 1179/2020 versa especificamente acerca do direito de arrependimento, importante ressaltar que isto não causará qualquer efeito prático (ou jurídico) nas devoluções realizadas em razão da falha na prestação de serviços ou de vícios e defeitos eventualmente existentes em produtos adquiridos pelo consumidor.
A vista disto, a Maran, Gehlen & Advogados Associados conta com uma equipe especializada e preparada para orientá-los neste momento de crise, que merece reforçada atenção e cautela.