O conceito de família tem se transformado ao longo dos últimos anos. Por muito tempo adotou-se o modelo de pai, mãe e filhos como padrão, contudo, os grandes números de divórcios, uniões estáveis, pais solteiros, inseminações artificiais e tantos outros, acabaram trazendo novas figuras familiares.
Por exemplo, hoje é possível encontrar diversas famílias formadas por apenas um dos pais e o filho (a), por um pai biológico e o outro socioafetivo, e ainda, casais com filhos adotivos ou sem qualquer registro de adoção (“adoção a brasileira”), dentre outros.
E foi justamente em decorrência dessas novas entidades familiares, pela existência de relacionamento entre pais não biológicos e seus “filhos”, que surgiu o conceito de “paternidade socioafetiva”.
A “paternidade socioafetiva” nada mais é do que a decorrente de vínculos sociais, afetivos, emocionais e não apenas de vínculos sanguíneos ou de adoção.
Diante de tais modificações nos conceitos familiares, o direito também precisou passar por algumas mudanças, a fim de se adaptar as novas demandas advindas destes relacionamentos.
Uma das primeiras mudanças ocorreu em 2002, quando o Código Civil trouxe em seu artigo 1.593 a possibilidade de existência de dois tipos de parentesco, um natural, ou seja, aquele que decorre de vínculo sanguíneo e outro civil, abrindo margem para as mais diversas formas de relacionamentos, algumas exemplificadas acima.
Veja-se a disposição do artigo 1.593 do Código Civil.
Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.
Contudo, tais modificações não param por aí. Em determinado momento verificou-se a possibilidade de registro civil concomitante por ambos os pais, ou seja, biológicos e socioafetivos/adotivos, a chamada pluriparentalidade, isso porque não há como determinar que uma deva prevalecer sobre a outra.
Afinal, se o filho possuí relacionamento com ambos os pais (consanguíneos e socioafetivos), ou simplesmente deseja ser reconhecido como filho de ambos, não apenas daqueles que o criaram, mas também daqueles que o geraram, não pode o Estado determinar qual é a figura mais importante.
Pelo contrário, deve ser levada em consideração a felicidade do sujeito e o seu direito a ver todos seus vínculos familiares reconhecidos, e foi neste exato sentido, que no julgamento do Recurso Extraordinário nº 898.060/SC em 2016, o C. Supremo Tribunal Federal, firmou a seguinte tese de repercussão geral.
A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais.
Desse modo, independentemente da existência de um registro anterior de paternidade (adotiva/socioafetiva), é possível, ao mesmo tempo, o reconhecimento e registro da paternidade biológica. Esta nova visão significa, na prática, que é permitido ao sujeito possuir tanto pais consanguíneos, quanto socioafetivos, devidamente reconhecidos em seus registros civis.
Luiz Gustavo Pimentel Alves de Souza
OAB/PR 89.319.