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02/07/2025

IMPACTOS DA REFORMA TRIBUTÁRIA NO TRANSPORTE AÉREO

A reforma tributária veiculada pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025 introduz profundas alterações na tributação sobre o consumo no Brasil. Entre os setores mais afetados está o da aviação comercial, cuja estrutura tributária será significativamente modificada a partir da adoção do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS)

 

Cenário Tributário Atual (Antes da Reforma)

 

PIS/COFINS: As operações de transporte aéreo estão sujeitas à incidência de PIS e COFINS, com tratamento diferenciado conforme o regime de apuração do contribuinte:

 

  • Regime Cumulativo: Lucro Presumido, nos termos da Lei nº 9.718/1998.
  • Regime Não-Cumulativo: Lucro Real, conforme Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003.
  • Desoneração Específica: A Lei nº 14.592/2023, art. 2º, reduziu a zero as alíquotas de PIS/COFINS sobre as receitas de transporte aéreo de passageiros[1].

 

ICMS: A Constituição Federal (art. 155, II) prevê a incidência do ICMS sobre o transporte intermunicipal e interestadual de passageiros, regulado pela LC nº 87/1996 (artigos 2º, II e 11, II, “a”). Contudo, por força da ADI 1600[2], julgada em 2001, o STF consolidou entendimento no sentido da inconstitucionalidade do ICMS sobre o transporte aéreo (intermunicipal, interestadual e internacional) de passageiros, bem como sobre o transporte aéreo (internacional) de cargas.

 

Novo Regime com a Reforma Tributária

 

A partir da implementação da EC nº 132/2023 e da LC nº 214/2025, o transporte aéreo de passageiros passa a ser tributado por IBS e CBS (artigo 4º), com alíquota de referência estimada em 26,5% para o setor, conforme estudos da IATA[3].

 

Para o transporte internacional de passageiros, o artigo 12, § 8º da LC[4] estabelece que, quando os bilhetes de ida e volta forem adquiridos conjuntamente junto à mesma companhia aérea, a base de cálculo corresponderá a 50% do valor total, reduzindo a carga efetiva à metade (13,25%, com base na carga estimada).

 

Foi instituído, para a aviação regional (aviação doméstica com voos com origem ou destino na Amazônia Legal ou em capitais regionais, centros sub-regionais, centros de zona ou centros locais), um regime específico, com redução das alíquotas de IBS e CBS em 40%, que está previsto no artigo 284, IV e § 1º, VIII, e artigo 287 da LC, conforme autorização do artigo 156-A, § 6º, IV da Constituição Federal.

 

Impactos Econômico-Tributários Estimados

 

Segundo a IATA, a adoção do novo modelo acarretará[5]:

 

  • Aumento do preço médio da passagem doméstica de R$ 743,00 para R$ 914,00.
  • Aumento do preço médio da passagem internacional de R$ 4.230,00 para R$ 5.345,00.

 

Além disso, sobre o Querosene de Aviação (QAV), insumo essencial na aviação, haverá a incidência de IBS e CBS (LC 214, artigo 172, VII) e sobre determinadas aeronaves e embarcações haverá a incidência do novo Imposto Seletivo. A possibilidade de cobrança de IBS e CBS sobre contratos de leasing de aeronaves[6] e importação de peças e serviços especializados também são fatores que agravam ainda mais a futura carga tributária do setor.

 

Diante desse novo cenário tributário, o setor aéreo brasileiro enfrentará desafios para manter sua competitividade econômica. A elevação da carga tributária, somada à complexidade operacional da transição para o novo modelo, exigirá das companhias aéreas um esforço contínuo de adaptação e planejamento estratégico.

Escrito por:

Tailani Jamili Reis (estagiária)

Gabriela Loss (advogada – OAB/PR 57.065)

 

 

[1] Lei nº 14.592/2023 – “Art. 2º A partir de 1º de janeiro de 2023, ficam reduzidas a 0% (zero por cento) as alíquotas da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição para o PIS/Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) incidentes sobre as receitas decorrentes da atividade de transporte aéreo regular de passageiros. § 1º O disposto no art. 17 da Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004, não se aplica aos créditos vinculados às receitas decorrentes da atividade de transporte aéreo regular de passageiros de que trata este artigo. § 2º A redução de alíquotas de que trata o caput deste artigo aplica-se aos fatos geradores que ocorrerem até 31 de dezembro de 2026.”

[2] “CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. LEI COMPLEMENTAR 87/96. ICMS E SUA INSTITUIÇÃO. ARTS. 150, II; 155, § 2º, VII ‘A’, E INCISO VIII, CF. CONCEITOS DE PASSAGEIRO E DE DESTINATÁRIO DO SERVIÇO. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. ALÍQUOTAS PARA OPERAÇÕES INTERESTADUAIS E PARA AS OPERAÇÕES INTERNAS. INAPLICABILIDADE DA FÓRMULA CONSTITUCIONAL DE PARTIÇÃO DA RECEITA DO ICMS ENTRE OS ESTADOS. OMISSÃO QUANTO A ELEMENTOS NECESSÁRIOS À INSTITUIÇÃO DO ICMS SOBRE NAVEGAÇÃO AÉREA. OPERAÇÕES DE TRÁFEGO AÉREO INTERNACIONAL. TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL DE CARGAS. TRIBUTAÇÃO DAS EMPRESAS NACIONAIS. QUANTO ÀS EMPRESAS ESTRANGEIRAS, VALEM OS ACORDOS INTERNACIONAIS – RECIPROCIDADE. VIAGENS NACIONAL OU INTERNACIONAL – DIFERENÇA DE TRATAMENTO. AUSÊNCIA DE NORMAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS DE COMPETÊNCIA ENTRE AS UNIDADES FEDERADAS. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO ART. 151, CF É O DAS RELAÇÕES DAS ENTIDADES FEDERADAS ENTRE SI. NÃO TEM POR OBJETO A UNIÃO QUANDO ESTA SE APRESENTA NA ORDEM EXTERNA. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE AÉREO, DE PASSAGEIROS – INTERMUNICIPAL, INTERESTADUAL E INTERNACIONAL. INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DO ICMS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL DE CARGAS PELAS EMPRESAS AÉREAS NACIONAIS, ENQUANTO PERSISTIREM OS CONVÊNIOS DE ISENÇÃO DE EMPRESAS ESTRANGEIRAS. AÇÃO JULGADA, PARCIALMENTE PROCEDENTE.” (ADI 1600, Relator(a): SYDNEY SANCHES, Relator(a) p/ Acórdão: NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, julgado em 26-11-2001, DJ 20-06-2003 PP-00058 EMENT VOL-02115-09 PP-01751)

[3] IATA- International Air Transport Association – Associação comercial que representa cerca de 350 companhias aéreas, responsáveis por mais de 80% do tráfego aéreo global. Informações institucionais disponíveis em: https://www.iata.org/en/about/history/. Acesso em: 30/06/2025. Em junho de 2025, no âmbito da reforma tributária sobre o consumo no Brasil, a IATA assinou uma CARTA CONJUNTA, com recomendações do setor sobre o tema; disponível em: https://www.iata.org/contentassets/0b6d1c34ebb24fa390b6030be3327751/2025/carta-conjunta-transporte-aereo-internacional.pdf. Acesso em: 30/06/2025.

[4] Lei Complementar 214/2025 – Artigo 12. (…) § 8º No transporte internacional de passageiros, caso os trechos de ida e volta sejam vendidos em conjunto, a base de cálculo será a metade do valor cobrado.

[5] BARCELLOS, C. Reforma Tributária pode reduzir demanda por voos em 30%. Poder 360. Publicado em 02/06/2025. Disponível em: https://www.poder360.com.br/poder-economia/reforma-tributaria-pode-reduzir-demanda-por-voos-em-30/ . Acesso em 10/06/2025.

[6] Vale lembrar que a questão da incidência de ICMS sobre arrendamento mercantil internacional já foi judicializada e assim resolvida pelo Judiciário: No STF, conforme Tema de Repercussão Geral nº 297, “Não incide o ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, salvo na hipótese de antecipação da opção de compra, quando configurada a transferência da titularidade do bem” e, no STJ, conforme Tese fixada no Tema Repetitivo nº 274, “O arrendamento mercantil, contratado pela indústria aeronáutica de grande porte para viabilizar o uso, pelas companhias de navegação aérea, de aeronaves por ela construídas, não constitui operação relativa à circulação de mercadoria sujeita à incidência do ICMS”.

Escrito por:

Gabriela Loss
Advogada - OAB/PR 57.065 break Departamento Tributário (Curitiba) break gabriela.loss@marangehlen.adv.br break

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