O simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte não constitui fato gerador do ICMS.
Esse é o entendimento consolidado e antigo do Poder Judiciário, conforme Súmula do Superior Tribunal de Justiça, de 1996 (Súmula nº 166/STJ).
Em 2021, ao julgar a ADC nº 49, o Supremo Tribunal Federal reafirmou tal entendimento, decidindo que não há ICMS mesmo quando a operação é interestadual.
Na ADC, o Supremo determinou “a modulação dos efeitos temporais da decisão para o exercício de 2024”; de modo que, “exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos do mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos”.
A ADC continua em tramitação. Em 30/11/2023, o SINDICOM opôs novos embargos de declaração, com o objetivo de demonstrar sua legitimidade processual (mesmo sendo amicus curiae) para pleitear o esclarecimento de questões obscuras do julgamento do STF.
Especialmente após a decisão do STF, ocorre intensa movimentação política e legislativa na tentativa de disciplinar a questão, tanto do Congresso Nacional quanto do CONFAZ.
Do cenário no CONFAZ, cabe destacar:
– Convênio ICMS nº 174/2023. O Convênio foi celebrado e publicado no Diário Oficial da União (Despacho nº 69/2023). Porém, o Estado do Rio de Janeiro não o ratificou, alegando que a transferência do crédito de ICMS é um direito do contribuinte, mas não uma obrigação (como constava no texto). Por isso, esse Convênio foi rejeitado (Ato Declaratório nº 44/2023);
– Convênio ICMS nº 178/2023. Tentando evitar a necessidade de ratificação unânime (de todos os Estados e do DF), o CONFAZ celebrou novo Convênio; agora, sem mencionar a Lei Complementar nº 24/1975 (a qual exige a ratificação unânime). Foi mantido o caráter obrigatório: quando houver a transferência de mercadorias entre estabelecimentos próprios em operações interestaduais, o contribuinte ficará obrigado a transferir os créditos de ICMS (observada a disciplina do Convênio). Em tese, esse Convênio produzirá efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024.
Quanto às medidas do Poder Legislativo, importa ressaltar o Projeto de Lei Complementar PLP nº 116/2023. Esse Projeto teve início em 2018, no Senado (PLS nº 332/2018). Foi aprovado pelo Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados, onde, em 05/12/2023, foi aprovado, conforme notícia da Câmara.
Há minúcias jurídicas que permeiam esse tema e que podem ter impacto relevante para os contribuintes, como:
– A modulação dos efeitos na ADC nº 49 abrange a integralidade da decisão de mérito ou diz respeito apenas ao dever dos Estados de disciplinarem a transferência dos créditos do Imposto? A nosso ver, a modulação temporal trata apenas do prazo para os Estados disciplinarem a transferência dos créditos de ICMS, não afetando o conteúdo da decisão na parte em que tão somente ratificou o que já era pacífico (não ocorrência de fato gerador nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos);
– Será constitucional e legal um Convênio do CONFAZ celebrado sem uma precedente lei complementar?
– Será constitucional e legal um Convênio do CONFAZ sem a ratificação unânime das Unidades Federadas?
Como se percebe, o assunto do ICMS nas transferências entre estabelecimentos próprios ainda parece estar longe de ser resolvido. É necessário acompanhar os desdobramentos da matéria.
Maran, Gehlen & Advogados Associados.
Este artigo tem caráter meramente informativo e não constitui orientação jurídica.