Tendo em vista que o cenário contratual tem se tornado cada vez mais diversificado, métodos comumente utilizados pela common law são, têm sido aplicados por empresas internacionais que possuem sede no Brasil ou, até mesmo, empresas brasileiras ou com negócios internacionais.
Isso porque, a necessidade de trazer benefícios e garantias contratuais para as partes tornou-se cada vez mais comum no meio societário/empresarial, trazendo para dentro das relações contratuais cláusulas que possam beneficiar as partes contratantes.
Tratam-se de cláusulas protetivas às partes, que preveem e determinam de quem será a responsabilidade por prejuízos que possam ser materializados somente após o fechamento dos contratos.
Na busca de cláusulas que assegurem as partes contratantes, surgiu o debate sobre a possibilidade da inclusão da cláusula de declarações e garantias nas negociações em contratos de M&A de fusões e aquisições de empresas no cenário do direito brasileiro, já que esta cláusula permite que, em algumas vezes, o declarante manifeste declarações diversas à realidade, o que vai contra o princípio da boa-fé contratual.
Esta cláusula é denominada como Cláusula de Sandbagging e procura assegurar o negócio contratado.
A inclusão desta cláusula costuma ocorrer na due dillegence, que tem como principal objetivo buscar e avaliar os possíveis riscos, benefícios e análise da documentação das partes do contrato. Das atividades principais a qual esse processo consiste, são essas: a busca de passivos, insuficiências, contingências e além disso, apurar custos e riscos de diversas naturezas para realizar o negócio, tais como de natureza fiscal, previdenciária, trabalhista, ambiental, imobiliária, cível, societária e diversas outras que possam vir a influenciar na negociação ou em situações que empresas brasileiras possuam alguma infração contra as regras do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)
Visto que, se trata de uma clausula indenizatória, ela possui como objetivo delinear quem será responsável por eventuais perdas materiais após o fechamento da operação contratual, determinando quem se responsabilizará pelos ativos que antes do fechamento ainda lhe pertenciam. Portanto, é uma maneira de buscar uma indenização conhecida e, por conseguinte, gera maior proteção ao comprador.
Esta cláusula repassa à um dos contratantes (comprador ou vendedor) a responsabilidade pelas perdas e passivos contraídos antes da constituição do contrato, mas que serão materializadas posteriormente ao fechamento do contrato.
Porém, a utilização da referida cláusula nos termos do common law, permitiria a possibilidade de que um declarante se valesse de declarações não dotadas de absoluta veracidade e, ainda, beneficiar-se por tal fato, uma vez que isso não lhe conferiria direito à quebra contratual, tampouco, obrigaria a parte causadora ao pagamento de perdas e danos por referido fato.
Para o direito brasileiro, mencionada cláusula conflita com o princípio da boa-fé objetiva contratual, pois limita a responsabilidade contratual.
Além disso, há conflito com o princípio da boa-fé contratual esculpido no artigo 422 do Código Civil, que assim determina: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.
Desta feita, partindo do princípio que a boa-fé contratual é um princípio, se verificado que a outra parte já possuía conhecimento de possível risco iminente antes do fechamento do contrato, pode ser reconhecia a existência de má-fé, incorrendo na declaração de nulidade da referida cláusula.
Desta feita, ao analisar a validade da Cláusula de Sandbagging dentro de um contrato realizado sob a jurisdição brasileira, deve-se observar qual a real intenção de que poderá se beneficiar a sua aplicação, ou seja, se existia no momento da constituição do contrato a intenção de tirar proveito da situação
Correto dizer, assim, que há uma presunção relativa da boa-fé subjetiva e que a má-fé na sua utilização deve ser demonstrada.
Visto que a interpretação é múltipla na utilização dessa cláusula indenizatória extraída do common law, os tribunais do país a interpretam de diversas formas.
O E. TJSP (Agravo: n° 2019.0000913496) em um julgamento específico evidenciou a importância que esta cláusula teria em determinada transação de contrato de M&A.
Assim, desde que seja respeitada a boa-fé subjetiva, inerente aos contratos brasileiros, a utilização da cláusula em comento pode vir ser favorável em transações empresariais, vez que traz benefícios, principalmente, às empresas que possuem contratos de grande risco.
Escrito por Isabella Faria dos Reis de Oliveira (Estagiária) e Marcela Marcondes Rodrigues (OAB/PR 72.324)