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Artigos, Covid-19
23/04/2020

COVID-19: NECESSIDADE DE PARCIMÔNIA E A CONVOCAÇÃO À CONCILIAÇÃO

De todos os aspectos e reflexos, atuais ou aqueles ainda a advir, à pandemia de coronavírus, nas relações privadas, talvez de todos aqueles o mais evidente, e que exprimirá cabal necessidade à solução de conflitos, exigirá um exercício de parcimônia; um verdadeiro “colocar-se na pelo do adverso”, para que uma composição possa se fazer possível.

Aos tempos modernos, nunca nossa sociedade foi atingida por algo do gênero; o Brasil é verdadeiramente um país abençoado: não se localiza em área passível de desastres naturais graves (como terremotos, tsunamis, etc.); possui muita água; regiões de florestas; boa biodiversidade; vastos espaços agricultáveis mecanizados, e para inserção e criação de animais; minérios; e toda sorte de benesses ao desenvolvimento. Mas o despreparo da população ao enfrentamento da crise evidencia outra problemática: o déficit legislativo, e consequentemente jurídico, à administração dos variados embates inerentes à complexidade das relações sociais.

Os conflitos a advir serão dos mais variados: empresas em litígio com bancos, respondendo ao mesmo tempo, ações trabalhistas, e com problemas operacionais, sejam ao pagamento das despesas fixas como alugueres, luz, água, impostos, etc., ou obstáculos com fornecedores e terceiros vinculados à atividade explorada; desempregados, que eventualmente promoverem ações contra seus ex patrões, já que tal qual a empresa, estarão em obstáculo para honrar dos pagamentos de suas necessidades (alugueres, luz, água, alimentação, impostos, etc.); empresários, grandes ou pequenos, que hão de preocupar-se tanto com a saúde da pessoa jurídica, como de sua própria família e custos de ordem particular; autônomos, cuja situação será idêntica à dos desempregados e empresários conjuntamente; pais e mães, e em mente, a dificuldade de cumprir obrigações alimentares, exercer direito de visitas ou guarda; idosos, sob regime de internamento ou outro assemelhado, sem poder receber a visita de familiares; pessoas jurídicas ou físicas em geral, que em razão do fechamento ao atendimento público às diversas searas governamentais e suspensão de prazos, não conseguiram obter restituição de valores, viram paralisados os andamentos processuais administrativos, que impeçam vantagens, ou concessão de aposentadorias, auxílios doença ou acidente, dentre outros.

Principalmente às áreas do direito a regular interesses privados, interpessoais, negócios, comércio, indústrias, empresas, familiares, sofrerão impactos diretos e indiretos, já que são a base da sociedade. E inegável: como não há lei a regular especificamente cada qual das particularidades enfrentadas, e tratando a situação em concreto de algo absolutamente extraordinário, nebulosas serão as soluções de conflitos jurisdicionais, e não raro, decisões que trarão extremo prejuízo a uma das partes, serão vislumbradas.

Se diz que situações extremas exigem medidas igualmente desproporcionais; entretanto, esta premissa não pode ser aplicada como recurso, senão, a beneficiar ambas as partes engendradas num problema de colisão de interesses. Mas nem sempre isto é passível de aplicação em um processo judicial, exatamente conquanto o magistrado há de guardar respeito à premissa abstrato legislativa – e em boa lembrança: o Poder Jurisdicional não necessariamente subsiste para “fazer justiça”, mas sim, para pacificar o litígio, aos olhos das leis de regência, o que à excepcionalidade da situação vivenciada, pode exprimir prejuízo de ordem irreversível a uma das partes do processo.

Considerando do todo, e sob ótica do enfrentamento da crise em detrimento dos interesses unicamente pessoais, uma solução mais adequada o seria a composição; um acordo, onde nenhuma das partes litigantes necessite assumir inteiramente o “risco do processo”, mas sim, que abdicando de parte de seu direito, interpretação, e maleando a irredutibilidade ao posicionamento de uma ou outra questão, permita adequar a colisão aos posicionamentos contrapostos, com parcimônia, e compreensão de que de nada adianta uma vitória, quando o derrotado assim já se mostra.

Se o intuito de um é “pagar”, e o de outro, “receber”, após o retorno da vida social como a conhecíamos, o desafio de todos os operadores do direito será buscar a conciliação das partes, em detrimento de outras premissas, já que a falência da base de nossa nação prejudicará qualquer intenção de alavancar ou retomar o crescimento.

Escrito por:

Laércio Losso Lisbôa
Advogado - OAB/PR 33.780 break Departamento Cível e Comercial break laercio.lisboa@marangehlen.adv.br break

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